Dr. Dídimo Guerra, primeiro advogado de Surubim, extinguiu a "palmatória" forma de castigo nas escolas.
Dídimo Gonçalves Guerra nasceu em Cachoeira de Casinhas, atual  município de Casinhas, em 7 de julho de 1896, filho de José Gonçalves  Guerra, natural de Casinhas e de Balbina Umbelina Guerra, do Tambor. .  Avós paternos, João Gonçalves e Ricarda.
Avós maternos  Joaquim Dutra e Clementina. Dídimo Guerra é o segundo  de uma família de 13 irmãos ente eles Josefa, José Malaquias, Severina  (Biusa), Gonçalo, Maria, Manoel (falecidos) e Adelaide Guerra de  Albuquerque. Do primeiro casamento de José Gonçalves Guerra e Maria  Guerra  nasceu Maria Mirandolina, falecida.
Embora precárias as condições de vida da nossa família, meu pai  sempre se esforçou para que todos nós aprendêssemos pelo menos a assinar  o nome. Para isto mudou-se de Cachoeira de Casinhas para o povoado de  Casinhas mais ou menos no ano de 1901, para que eu e minha irmã Josefa,  mais velha um ano, freqüentássemos a escola particular ministrada pela  professora Filomena Gonçalves, prima e ex-cunhada do meu pai. Nesta  escola devo ter permanecido cerca de dois anos, na qual cheguei a  iniciar a leitura do segundo livro de Laudelino Freire que me deixou o  espírito melhorado de bons exemplos pelo enredo que encerrava.
Deixando a minha prima e primeira professora de ministrar o  ensino particular, por não mais lhe convir, passei uma temporada fora da  escola. Por volta de 1905, apareceu em Casinhas o professor Antonio  Severino Alves que organizou uma escola particular. No primeiro dia de  aula eu ali me achava para receber religiosamente as suas explanações.  Eu pertencia a classe
mais adiantada embora fosse o mais novo e menor.
Escola mista freqüentada até por moças e rapazes. Destes, alguns logo  no ano imediato, casaram-se. Contra os mesmos, o castigo bolo não era  imposto, mais teriam de ser colocados em plano inferior, quando  deixassem de responder as perguntas que lhes foram feitas e fossem  respondidas por outros que se achassem em plano inferior.
Os alunos eram colocados em duas filas. A do sexo masculino à direita  do professor e a do sexo feminino à esquerda. Quase sempre no fim dos  argumentos me achava colocado na frente de todos. Quando isso sucedia, o  professor tinha essas palavras irônicas para os que perdiam o lugar.  “Os gigantes foram esmagados por um pigmeu”.  Não compreendia o  significado da palavra, mas entendia ser uma crítica aos que eram  obrigados a me cederem o lugar.
Não aprendia facilmente. A vantagem que tinha sobre alguns dos  meus colegas, era porque me esforçava, levado pelo medo, aliado à  vergonha de errar, visto que o professor não dispensava e nem perdoava  ninguém. A palmatória trovejava sem dó nem piedade para qualquer falta  cometida porque não se dispensava o aluno que deixasse de responder os 
pontos das lições. O desejo que tinha de aprender era imenso.  Decorávamos gramática, aritmética, Doutrina cristã, etc, adequada à  classe, e ficávamos como papagaios quando 
prendem a falar.
Eu e meus colegas nada mais sabíamos do que aquilo que estava escrito  e aprendíamos decorado. Não éramos capazes de dar uma definição ou  fazer uma explanação do que haviamos estudado, nem a razão porque  gramática é gramática e aritmética. Éramos papagaios de fato. Nada mais.
Dada dificuldade financeira de meu pai, tive que passar somente um  ano e alguns  meses. Sofri imensa e intimamente ao deixar essa escola,  embora demasiadamente rigorosa dada aos castigos físicos que ali sofriam  os alunos que não se portavam bem ou que a inteligência não ajudasse a  decifrar e a compreender o ensino que ali era ministrado.
Quantas vezes ao avistar o professor chorei amargamente? Sentia uma  revolta tremenda de não ter meios de continuar a aprender. Censurava  intimamente muitos dos meus colegas que podiam e não queriam aprender e  desejavam mesmo a extinção da escola...
Com a saída do professor Antonio Severino Alves, fundou-se uma  escola sendo a professora uma das minhas colegas, de nome Maria Digna do  Rego Medeiros. Para que não esquecesse do que havia aprendido, segundo  dizia meu pai, fiz parte dessa escola, parecendo- me o ano de 1906.  Antes da aula, que começava às nove horas da manhã, ia ao roçado, a dois  quilômetros de distância da nossa casa, para dali trazer alimentação  para os animais domésticos que criávamos: cabras, porcos e galinhas. A  tarde, depois do encerramento das aulas, que ocorria a cerca das  quatorze horas, ao chegar em casa jantava e em seguida saía com minha  mãe e outros irmãos para prestar serviços agrícolas para só voltarmos do  roçado ao escurecer. Quando me dirigia ao trabalho costumava fazer um  retrospecto do que havia estudado retendo na memória o que foi  ministrado. Foi desejo meu, quando menino, se tivesse meios para  estudar, escolheria engenharia. Não sei se porque achasse o nome bonito  ou talvez me impressionasse a sua pronúncia.
De 1907 até o fim de 1910, toda a minha atividade resumiu-se tão  somente a agricultura. Trabalhava na enxada e na limpa da lavoura que  começava logo ao clarear do dia até o sol se encobrir no horizonte. Dos  livros nem notícias porque o trabalho consumia o tempo disponível e  depois da ceia, de volta do roçado, tratávamos logo de dormir para que  no dia seguinte estivéssemos com as forças refeitas”. 
A partir de  1905, Dídimo Guerra esteve varias vezes na vila de São José do Surubim,  acompanhando sua mãe em visitas a parentes e conhecidos, assistindo  procissão em homenagem a São José, o santo padroeiro, ou fazendo  pequenas compras, na feira, a mandado do pai. O menino curioso,  inteligente e sensível conheceu deslumbrado a pequenina Surubim. Na  memória guardou carinhosamente estes pequenos e grandes momentos que  desabrocharam muitos anos depois, nas crônicas de sua meninice e  adolescência. Nasce uma paixão que o acompanhará por toda sua  existência: Surubim. Terra que escolheu para viver no ano de 1913,  quando aceitou convite para trabalhar numa casa comercial.
No ano de 1918, casou-se com Severina Cabral Guerra, filha de  Frutuosa Batista Cabral e Sebastião Cirilo Cabral. Desta união nasceram  José (Zé Guerra), Paulo, Sólon, Dídimo (Dr. Jadi), Olavo, Diva, Santa,  Gilvando e Carlos. Severina era uma mulher calma, alegre, delicada,  católica fervorosa e muito dedicada a família. 
Dídimo Guerra não  estudou música. Porém, compunha e tocava vários instrumentos: violino,  violão, serafina, bandolim e saxofone. Fez parte da Banda 14 de março,  fundada em 1914, posteriormente conhecida por Banda e Filarmônica Cônego  Benigno de Lira. Com músicos Chico Gago, Evaristo Amorim, Severino  Ginu, Zé de Mila e outros participou da pequena orquestra que  acompanhava, de improviso, os filmes no cinema mudo, de propriedade de  Antonio Justino, fundado em 1925. Nas recepções religiosas especiais  tocava serafina no coro da antiga matriz de São José. E solitário fazia  serenatas no encantamento das noites silenciosas e cúmplices.
Foi um dos redatores do Surubim Jornal, Ano 1, N° 1, de 15 de  novembro de 1928, Edição Comemorativa da Independência de Surubim. No  governo do Coronel Dídimo Vieira Carneiro da Cunha, eleito o nosso  primeiro prefeito, Dídimo Guerra participou como Oficial do 1º Distrito,  Surubim. 
Inicia-se a trajetória de um homem que, com determinação e  coragem, trabalhou e lutou em defesa da dignidade humana. Enfrentando  todas as dificuldades formou-se Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais  pela Faculdade de Direito, de Alagoas, em 19 de março de 1937,  recebendo o diploma em 26 de julho de 1946. No dia 7 de março de 1947,  inscreveu-se na Ordem dos Advogados do Brasil, Secção Pernambuco. N° 1199,  Registro 964.  “Sou um defensor e propugnador do Direito e da Justiça,  estejam ao lado de quem estiverem”. Escreveu em uma das suas crônicas  datada de 12 de maio de 1937. E assim o fez nas  causas que abraçou, nos  equívocos que cometeu e nos acertos que o fortaleceram a seguir  adiante, acreditando que os seus ideais transformariam corações e  mentes.
DIDIMO GONÇALVES GUERRA
Apoia a Revolução de 1930. Em 24 de outubro de 1930, Getúlio Vargas assumiu a presidência da República. 
“ Com o advento da Revolução de 1930, por cuja causa me bati, vi que o  poder central daquela  época queria transformar em sua vontade os  direitos de um povo livre, continuei a acompanhar e zelar,  embora  no meio matuto, por esses ideais que ao meu ver transformariam o Brasil  num  país capaz de ser reconhecido lá fora, como o modelo dos  governos”.
Em 15 de agosto de 1936, assume o cargo de vereador do município  do Surubim, eleito por “esmagadora maioria”, no pleito que elegeu seu  amigo e correligionário Paulo da Mota 
Silveira, prefeito do Surubim. 
Eleito Presidente da Câmara Municipal do Surubim. Faz oposição veemente  e sistemática ao golpe de 37. Em 10 de novembro de 1937,  Vargas  instaura o Estado Novo. 
Colaborador dos jornais o Planalto e a Voz de Surubim. 1937. 
Escreve para os diretores dos jornais Diário da Manhã, 21.05.1937, e  Folha do Povo, 1946 e 21.11.1946, de Recife, denunciando o cerceamento  da liberdade de imprensa e do direito de livre opinião do cidadão.
Inspetor de ensino do Município do Surubim. Segundo sua filha  Diva Guerra Brandão proibiu o uso da palmatória ( uma das formas de  castigo) nas escolas municipais. 
Em 17 de novembro de 1946, fundou  com outros companheiros o Comitê Municipal do Partido  Comunista do  Brasil, na cidade de Surubim. 
Em 1947, o Comitê Municipal do  Partido Comunista do Brasil, apóia a candidatura de Pelópidas Silveira  para governador de Pernambuco. Vence Barbosa Lima Sobrinho.
Prefeito interino do Município do Surubim. “Embora nada pudesse  realizar, a não ser uma limpeza geral que fiz por trás das ruas da  cidade, porque o plano de construção do reservatário d’água para o  abastecimento da população pobre da cidade, que pretendi iniciar, foi  barrado pela maioria do conselho ( vereadores ) que não quis compreender  a finalidade da obra que pretendia fazer. Tudo só depende de um pouco  de boa vontade, de trabalhar em benefício da coisa pública. Quando  passei um  mês mais ou menos administrando Surubim, em 1947”.
Presidente do Diretório do Partido Popular Progressista, de Surubim. 1947. Presidente da União Operário Beneficente. 1950. 
Orador convidado para recepções a personalidades que visitavam Surubim.  Escolhido membro da diretoria, e orador da Filarmônica Cônego Benigno  Lira. Advogado privado e defensor público da comarca do Surubim.
No dia 22 de fevereiro de 1961, aos 65 anos, morreu Dídimo Gonçalves Guerra. Advogado  de  reconhecida competência, exerceu a profissão com imparcialidade e  dignidade. ‘Cariosamente conhecido como o Pai dos Pobres e Advogado dos  Pobres.
DEPOIMENTOS:
“Dídimo começou os estudos em Casinhas, com o professor  muito competente, que se chamava Severino. O mesmo que ensinou minha  irmã Josefa e Manoel Veiga. Quando a família foi morar no Tambor, ele  continuou seus estudos. Era tão esforçado que, enquanto mãe ia rezar o  terço na igreja, ele ficava estudando a luz do candeeiro. Já rapaz  trabalhou com um primo, perto de Nazaré da Mata. Em Surubim, já casado e  com muitos filhos estudou Direito, em Maceió, Alagoas. Sempre foi uma  pessoa estudiosa e sacrificada, que lutou muito para se formar e manter a  família, O meu irmão era um homem manso e muito caridoso e por causa de  sua bondade ficou conhecido como advogado dos pobres. Caso uma pessoa  não pudesse pagar, ele trabalhava de graça”. Adelaide Guerra de Albuquerque.
“Nosso pai foi agricultor, comerciante e trabalhou com seu  Aníbal, no Cartório. A partir daí decidiu estudar Direito. Ele escrevia  muitas coisas no seu diário, principalmente sobre os acontecimentos do  município de Surubim. Adorava ler e possuía biblioteca especializada em  Direito, obras de Arte e romances. Pena que, com o tempo, os livros  tenham na sua grande maioria se estragado. Mas até hoje guardo com  carinho: Museus dos Paises Baixos e Museu do Prado, Madri Espanha, da  coleção de Álbuns das Galerias da Europa. Ele era uma pessoa sensível ,  esforçada e preocupada com o bem estar das outras pessoas. Caso fosse  necessário, tirava do que era seu, de sua família, para ajudar alguém.  Ele faz muita falta”. Diva Guerra Brandâo e Paulo Gonçalves Guerra.
“Dídimo Guerra era uma pessoa mito simples e muito popular.  Prestava atenção a todo mundo. Quando sabia que a causa era perdida,  avisava ao interessado para que ele não gastasse em vão. O  escritoriozinho dele ficava ali, na atual rua Antonio Farias, no 65. Um  ótimo irmão, uma criatura muito boa”. Severina Guerra Leal.( Biusa).
“Meu pai era excelente e muito bom amigo. Gostava de conversar e  era muito alegre. Fazia amizade com qualquer pessoa, independente de  sua situação financeira, O mais importante para ele era servir, e o  fazia da melhor maneira. Porém, não gostava de tratar dos casos de  herança, pois falava que sempre havia confusão. Então, fazia o possível  para que todos encontrassem a melhor solução. Foi advogado de muitos  comerciantes, agricultores e pecuaristas, entre eles, Major Turíbio  Severino de Paula e Emiliano Farias. Teve um tempo que meu pai abriu uma  lojinha de roupas e móveis populares, para atender às pessoas que não  tinham condições de comprar à vista. Foi o primeiro crediário de  Surubim. Porém , outras pessoas interferiram no negócio e com muita  tristeza acabou fechando. 
O Pai dos pobres, como era conhecido, gostava de gente de pé no chão e dizia muito: 
“Não se nega esmolas, pois quem pede, precisa”. Nos dias de sábado  existia sempre uns trocados e bolachas que mandava buscar na padaria de  Paulo, meu irmão, para dar as pessoas necessitadas. Quando adoeceu, foi  grande a tristeza do povo, pois sabia o amigo e protetor que ia perder.  Meu pai, foi um pai para muita gente”. Santa Guerra.